Empresários pedem foco na reforma

No momento em que o governo de Jair Bolsonaro chega ao fim de seu terceiro mês, banqueiros, empresários e executivos são unânimes em avaliar que o presidente da República precisa deixar de lado as polêmicas e os enfrentamentos e colocar o foco no que realmente importa, a reforma da Previdência. Avaliações colhidas pelo Valor, algumas feitas sob condição de anonimato, variam de algum grau de apreensão a até uma declarada decepção com o que se viu neste primeiro trimestre de mandato.

O presidente de um banco de varejo se diz desapontado com o desempenho do presidente Bolsonaro até aqui. “Esperava que ele fosse liderar e negociar [para a aprovação da reforma], mas isso não está acontecendo.” Em vista disso, nos últimos dias passou a temer pela reforma da Previdência. “Ser irredutível não dá certo. Não é assim que se dirige uma empresa e não é assim que se governa um país.”

O executivo critica especificamente a postura do presidente de não se sentar à mesa para negociar verbas para os parlamentares, algo que considera legítimo. “Bater boca com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, é inapropriado. Maia já provou a ascensão que tem sobre os deputados ao impor uma derrota acachapante para o governo nesta semana na questão do orçamento impositivo.” Sobre a aparente trégua que se configurou nesta quinta-feira em Brasília, com um tom mais ameno entre Bolsonaro e Maia e um almoço entre este último e o ministro da Economia, Paulo Guedes, o executivo se mostra cético. “Quero ver se materializar.”

Também pessimista, o presidente de um outro banco diz que o governo está “conseguindo se afogar num copo dágua” e que isso está hoje “no preço” dos ativos financeiros negociados no mercado. “Bolsonaro deveria conversar com todo mundo e ouvir as demandas republicanas. Dizer que não vai conversar porque todo mundo é bandido só cria animosidade até mesmo entre deputados que apoiam a ideia da reforma da Previdência.” Em suas contas, há uma chance de pouco mais de 50% de se aprovar uma reforma mais tímida, que proporcionaria economia entre R$ 500 milhões e R$ 700 milhões. “Há 15% de chance de dar tudo errado e 30% de chance de se aprovar uma reforma mais robusta.”

O presidente desse banco diz estar decepcionado porque esperava que Bolsonaro tivesse uma postura diferente da que tem demonstrado na presidência. “A popularidade dele está caindo e seguirá assim se nada mudar, porque dois terços dos seus eleitores não votaram por convicção, mas sim por medo de um governo do PT ou por causa da agenda econômica.”

Um terceiro banqueiro faz uma avaliação mais otimista que seus pares e acredita que o pragmatismo acabará se impondo na questão da Previdência. “Até o Rodrigo Maia diz que é preciso aprovar. Não existe alternativa. A opção é ter uma crise fiscal.” Ele classifica como “terrível” e “perda de tempo” o enfrentamento com os parlamentares, mas acredita que faz parte do jogo político e que um gesto político de aproximação pode por fim à crise. “E se houver uma semana de trégua, o mercado vai se recuperar.”

Para Walter Schalka, presidente da Suzano Papel e Celulose, o governo tem pouca experiência no campo político no que diz respeito à gestão do Congresso. “Ele precisa se reforçar nesse campo para dar chance de que a reforma saia ou intacta ou com baixo ajuste. Mas é um ponto de atenção. Não acho que seja algo que está indo para o caminho errado, mas tem de ajustar essa questão e colocar gente mais experiente para estruturar um apoio mais significativo à reforma dentro do Congresso.”

Laércio Cosentino, fundador da Totvs, maior empresa de softwares da América Latina, diz que não tinha expectativa de que as reformas acontecessem rapidamente. “Trata-se de um governo que ainda está em formação, numa sociedade que ainda vive em ebulição de opiniões partidárias.” Para o empresário, entretanto, a constante polêmica em torno das redes sociais não é produtiva. “É um desvio de atenção, que tira o foco para o que realmente interessa. Ele diz que o comportamento de Bolsonaro nas redes sociais “não parece o de um líder”.

Os executivos consultados elogiam o comprometimento de Paulo Guedes e equipe, mas avaliam que, sem o real apoio do governo, não conseguirão avançar com a agenda econômica. “Paulo Guedes fez um projeto da Previdência melhor do que se esperava e montou uma equipe também melhor do que se esperava. Mas hoje o vemos sozinho”, sintetiza um executivo.

Um outro empresário, com negócios em setores variados, diz que votou em Bolsonaro, mas que perdeu o entusiasmo, porque até agora o governo “só perdeu tempo”. “O governo entrou num pântano e não dá para saber se vai ser possível aprovar alguma reforma ou não.” Em sua opinião, a melhor alternativa teria sido aprovar rapidamente o projeto de reforma deixado pelo governo de Michel Temer. “Ele [Bolsonaro] não tem noção de timing político.”

Luis Pedro Ferreira, diretor da fabricante de autopeças Dana na América do Sul, diz que a agenda da redução do tamanho e do aparelhamento do Estado dão o tom da criação de um ambiente de negócios “mais positivo e menos oneroso, alinhando esforços na busca por competitividade global”. O executivo se queixa, por outro lado, da falta de interlocutores com a indústria no governo e também aponta obstáculos gerados pela extinção do ministério do Trabalho. “Isso dificulta, por exemplo, a obtenção de um simples visto de trabalho temporário para instalação de uma máquina, que deveria ser corriqueiro. Isso gera apreensão, que somada aos desafios da comunicação da reforma da Previdência, reforça nossa percepção de que há muito por fazer.”

Um outro dirigente do setor automotivo também se diz apreensivo, embora ainda mantenha a confiança. “Não vamos consertar o Brasil de um ano para o outro, mas precisamos e esperamos movimentos claros, que indiquem isso, preferencialmente sem polêmicas que apenas desviam nosso rumo e atenção.”

 

                                                                                                                                                    Via Valor Econômico

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