A expectativa pela chegada de uma encomenda gera ansiedade. Muitas vezes, é como aguardar por um presente de aniversário. Entretanto, a espera pode se tornar uma agonia se houver atrasos ou extravio. Problemas com serviços postais são recorrentes. Segundo dados do Instituto de Defesa do Consumidor (Procon-DF), apenas este ano, entre janeiro e agosto, foram registradas 114 reclamações desse tipo, contra 159 em todo o ano passado.
O Procon alerta que a relação de consumo entre pessoa física e transportadoras só existe quando o próprio consumidor contrata o serviço postal. Apenas nesses casos, portanto, o instituto pode intervir quando há desrespeito às regras legais. Se o problema na entrega for oriundo de uma compra on-line, o elo é estabelecido entre o fornecedor do produto e o serviço terceirizado de transporte. Assim, o consumidor deverá se reportar ao contratado, ou seja, à loja que vendeu o bem ou o serviço. O fornecedor é responsável pelas atividades delegadas a terceiros.
Apesar de acostumado a comprar em uma loja on-line, Francisco Mangas, 76 anos, enfrentou uma falha na distribuição de sua encomenda. Em abril, o aposentado adquiriu um produto com empresa especializada em artigos esportivos. A data coincidiu com a paralisação dos caminhoneiros, o que prejudicou a circulação de bens em todo o país. Levando em consideração esse imprevisto e também o prazo contratual, Francisco aguardou 30 dias e entrou em contato com a loja, que pediu um interstício de 10 dias para averiguar o que ocorrera com o transporte.
Passado o prazo requerido, ele buscou, mais uma vez, o setor de atendimento ao cliente, entretanto, a resposta recebida foi que o período para reclamação havia esgotado e que ele deveria resolver o litígio diretamente com o serviço postal. O consumidor explica que o prejuízo material não é o mais importante, mas o zelo com que os fornecedores tratam os compradores. “Quando eu busquei o atendimento, informaram que, como o pedido foi entregue à transportadora, eles se eximem de cumprir o acordo. Eu acho terrível essa postura”, diz.
“Não deveria ser eu penalizado por falhas nos processos dos serviços que eles terceirizam”, lamenta o aposentado. Por meio de nota, a empresa em que Francisco fez a compra, a Netshoes, informou que, para tentar contornar a situação desagradável, disponibilizou um vale-compras ao consumidor e se colocou à disposição em todos os canais de atendimento.
Regras
“A primeira regra a ser aplicada quando o fornecedor não consegue cumprir o contrato é questionar a outra parte se ela deseja manter o acordo ou se prefere rescindir e receber de volta os valores devidos. A empresa é obrigada a executar aquilo que ela oferta, nos termos dos artigos 30 e 48 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que tratam da vinculação do fornecedor a cumprir o acordado”, explica o professor de direito do consumidor do UniCeub Ricardo Morishita.
Ele alerta para outro grande erro na prestação desse tipo serviço: a alegação da decadência do prazo de reclamação. “O consumidor tem, legalmente, 90 dias para reclamar junto ao fornecedor, a contar da entrega do produto ou do serviço. Neste caso, o prazo ainda não teve início, a loja não entregou o bem, portanto, não há o que se dizer em período de contestação. E, mesmo que ela tivesse entregue o produto, o prazo contratual não afasta o prazo legal determinado pelo CDC.”
Ele também destaca que a empresa não deve transferir a responsabilidade ao seu cliente. “A loja deve arcar com o ônus da contratação de serviços terceirizados, o consumidor não é sócio da empresa”, afirma. Nesse sentido, lançar mão de mecanismos que auxiliem o cliente a efetuar a compra de maneira correta é primordial. “Todas as ações necessárias à contratação de serviço devem ser pensadas para evitar falhas, por exemplo, em sites de compras, a loja pode e deve oferecer meios de confirmação dos dados fornecidos pelo cliente, como o verificador automático de endereço e CEP”, sustenta Ricardo. Ele adverte que, quando a origem da falha for causada pelo consumidor, ele não terá direito à reclamação.
Defesa
A diretora-geral do Procon-DF, Ivone Machado, orienta o consumidor a buscar seus direitos quando ele efetua a contratação de um serviço de postagem. Quando a encomenda é extraviada, por perda ou roubo, a empresa deve indenizar todos os danos. “O valor da indenização corresponderá ao total gasto com os custos de envio acrescido do valor declarado do bem pelo consumidor no momento da postagem. Caso o consumidor não declare o valor da encomenda, a empresa poderá realizar uma indenização automática, com valores previstos para o serviço contratado”, explica. O prazo para requerer a restituição pecuniária é de até 30 dias após expirado o período de entrega.
Além de procurar a empresa para reclamar da falha, o consumidor dispõe dos órgãos de defesa para buscar a reparação. “Caso encontre dificuldades no atendimento e sinta que seus direitos não estejam sendo respeitados, ele pode procurar o Procon para registrar uma reclamação contra a empresa. Ela será notificada pelo órgão e terá 10 dias para apresentar uma resposta ao consumidor. Em caso de descumprimento da legislação consumerista, a empresa pode ser multada em até cerca de R$ 6 milhões”, conclui Ivone.
Via Correio Braziliense